terça-feira, fevereiro 4, 2025
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    Simeone reinventa o Atleti (de novo)

    Entre os principais clubes da Europa, nenhum técnico se aproxima da longevidade de Diego Simeone no Atlético de Madrid: 13 anos completos na última segunda-feira. Ninguém está isento de momentos de instabilidade durante tanto tempo, aparentemente nem Pep Guardiola, e o outro lado da moeda é que, quando eles chegam, fica inevitável se perguntar se o ciclo chegou ao fim.

    Uma eliminação precoce na fase de grupos da Champions League de 2022/23, em último lugar, sem acesso nem à Liga Europa, atrás de Porto, Club Brugge e Bayer Leverkusen, gerou aquele que talvez tenha sido o principal momento externo de dúvida sobre o futuro de Simeone no Civitas Metropolitano.

    O Atlético de Madrid terminou aquela temporada com uma arrancada que quase tirou o vice-campeonato do Real Madrid em La Liga e as especulações se dissiparam.

    Por acaso, acabamos de descobrir qual foi o principal momento interno de dúvida. Em uma entrevista recente, Simeone contou que, depois da segunda derrota na final da Champions League para o Real Madrid, em 2016, ponderou se “ainda tinha força para continuar liderando o grupo para um lugar ao qual é difícil de chegar”.

    Dois anos depois, foi campeão da Liga Europa.

    Houve uma experiência similar e menos intensa entre setembro e outubro. Após uma derrota para o Betis, o Atlético de Madrid havia conseguido apenas duas vitórias em oito partidas por todas as competições em um intervalo de um mês. Levou 7 a 1 no agregado para Benfica e Lille.

    Dois meses depois, derrotou o Barcelona no Camp Nou, pela primeira vez com Simeone fora de casa, chegou a 12 vitórias seguidas por todas as competições e virou líder de La Liga.

    A esta altura, temos um roteiro pronto quando o momento do Atlético de Madrid é ruim:

    • A defesa parou de funcionar com a excelência exigida pelo seu estilo.
    • Ele está tentando armar um time mais ofensivo, ou deveria estar, para que o processo de vencer um jogo de futebol não se assemelhe tanto a arrancar um dente.
    • Alguns jogadores estão dando sinais de que não suportam mais o desgaste físico e mental.
    • Errou no mercado.
    • Qualquer outra coisa relacionada a Simeone porque, depois de tanto tempo de casa, tudo naturalmente gira em torno dele.

    Pode ser que um ou outro desses problemas, brevemente talvez até todos eles, sejam verdadeiros, mas às vezes é apenas uma questão de ajustes.

    Houve uma significativa reformulação. Mario Hermoso e Stefan Savic foram responsáveis por cerca de 6.000 minutos defensivos na última temporada e agora estão em outros clubes. Gabriel Paulista e Caglar Söyüncü foram opções bastante periféricas para a zaga, mas também saíram. O Atleti finalmente desistiu de João Félix e cansou de reclamar dos gols perdidos por Morata. Saúl Ñíguez, em certo momento a grande esperança para o futuro colchonero, foi respirar novos ares em Sevilha.

    Simeone e a diretoria adotaram o caminho da consolidação. Investiram alto em quatro jogadores, além de Clément Lenglet por empréstimo. Ele e Robin Le Normand compuseram a zaga, Conor Gallagher reforçou o meio-campo, e Julián Álvarez e Alexander Sorloth, o ataque. Mudanças importantes em posições fundamentais. O maior desses investimentos, Álvarez, também é a maior decepção até agora, e é provável que ele precise de um bom tempo de adaptação.

    Talvez não esteja claro para todo mundo o que aconteceu com ele: trocou Guardiola por Simeone. Em vez de participar de todas as fases da criação, cair pelas pontas, jogar até como meia e ter 25 chances de gol por partida, agora ele precisa ser mais objetivo e contundente em suas ações, aproveitar as duas ou três bolas que caem no seu pé por jogo. É como se o baterista do Pink Floyd fosse para o Motorhead. Ainda é rock and roll, mas, sabe, diferente.

    Giuliano Simeone com o pai e técnico, Diego Simeone (Reprodução)

    Simeone precisou de um minuto para entender o que precisava fazer. O 3-4-1-2, a tática dominante, embora não exclusiva, desde o título espanhol de 2020/21 ficou para trás. Eles voltaram a praticar o bom e velho 4-4-2 em quase todas as partidas. Maior bandeira do clube no elenco, Koke perdeu espaço. O seu filho, Giuliano Simeone, sobe e desce pela meia-direita, que costumava ser o reino de Marcos Llorente, agora lateral direito. Ele varia um pouco no outro lado, entre Gallagher, mais meia, ou Samuel Lino, mais ponta. O ataque é Álvarez e Griezmann.

    Curioso como um técnico considerado ortodoxo como Simeone ficou tão bom em reinventar o seu time com a temporada em andamento. Sempre dentro de moldes parecidos, é verdade, e passou da hora de desistirmos de tentar mudá-los. O Atlético de Madrid é o que é. Simeone declaradamente prefere o 1 a 0 – “porque trabalhamos bem na defesa e tivemos contundência no ataque” – ao 4 a 3 – “se vencemos por 4 a 3, temos que revisar algumas coisas”.

    Não dominará a posse de bola com tanta frequência, não terá 30 finalizações com tanta frequência e conta mais com sua defesa que com seu ataque. Mas quando está jogando bem, é equilibrado como qualquer outro time. E quando está jogando mal, suas fragilidades ficam mais ressaltadas. Como qualquer outro time.

    Pode ser que não seja suficiente para realmente ser campeão espanhol, mas nunca podemos esquecer a realidade financeira de La Liga. Apesar de 12 anos consecutivos na Champions League e de ser um clube relativamente bem gerido, o Atlético de Madrid ainda trabalha com um faturamento menor do que a metade dos de Real Madrid e Barcelona – € 365 milhões contra cerca de € 800 milhões, segundo o último estudo da Deloitte, sobre a temporada 2022/23, sem contabilizar vendas de jogadores.

    O normal é que seja difícil. O normal é que não dê.

    Mas deu mais vezes do que o torcedor mais otimista esperava, e talvez dê mais algumas até o fim do contrato de Simeone em 2027, porque o Atlético de Madrid sempre terá a cara do seu treinador: intenso, apaixonado, às vezes (esportivamente) traiçoeiro, irredutível, incapaz de desistir.

    E quando está acuado, às vezes tão acuado quanto no último sábado, tanto o Atleti quanto Diego Simeone adotaram o hábito de dar a volta por cima e surpreender todo mundo.

    Bruno Bonsanti
    Bruno Bonsanti
    Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de ser redator, editor e sócio na Trivela. Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.

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