quarta-feira, março 12, 2025

Nova fórmula na Liga Europa por enquanto parece melhor

Quando a Uefa mudou a organização de suas competições no triênio de 2021/22 a 2023/24, oficializando a criação da Conference League, a Liga Europa conseguiu se beneficiar bastante do novo cenário. A fase de grupos foi enxugada, a quantidade de confrontos de peso aumentou, clubes tradicionais pareciam mais estimulados a focar no certame. Estas últimas três edições da LE possivelmente foram as melhores neste século até então. A edição de 2024/25, por sua vez, também passa por uma mudança abrupta por conta da nova Champions League. E, de novo, a Liga Europa pode crescer nesse processo.

Como já dito no texto acima, ainda é cedo para qualquer afirmação mais assertiva em relação às competições europeias. Não dá para saber direito nem até quando vai durar, com a sombra persistente da Superliga Europeia. Contudo, logo de cara, a Liga Europa tem um ganho bastante visível: o fim do sistema de repescagens, que levava os terceiros colocados da Champions à LE e os terceiros colocados da LE à Conference. O fato de serem agora torneios “autocentrados” valoriza a disputa em si, sem intrusos.

Desde o início, os times da Liga Europa sabem o nível das forças que encontrarão e o que os esperará nos mata-matas. Não há o risco de encarar um Chelsea ou um Atlético de Madrid frustrados porque não avançaram na Champions, sedentos por justificar a temporada. Hoje, a Liga Europa se indica como o torneio mais nivelado das três competições continentais da Uefa.

É verdade que persistem alguns clubes muito mais ricos do que outros, como são os casos atuais de Manchester United e Tottenham. Isso continuará acontecendo, até pelo degrau financeiro acima da Premier League. O Manchester City e até o Newcastle ainda podem colocar essa noção mais à prova na próxima temporada. Contudo, pegar um inglês vindo de temporada média não parece um desafio tão grande a clubes também fortes em outras grandes ligas nacionais. Lazio, Athletic Bilbao, Lyon ou Eintracht Frankfurt têm recursos suficientes, sobretudo diante das fases cambaleantes de Red Devils e Spurs. O mesmo pode se dizer de bastiões de campeonatos secundários, por mais que não vivam seus melhores dias, tal qual um Porto ou um Ajax.

A Champions League tende a continuar sendo um terreno muito fértil às superpotências, ainda que o novo formato crie aberturas e aleatoriedades nos caminhos dos mata-matas – basta ver o sorteio que acabou de rolar, com maiores chances de confrontos de peso precoces e de atalhos abertos às quartas de final. Já a Conference é riquíssima pela quantidade de países que privilegia, com 19 nações distintas representadas nos atuais mata-matas, embora as fases mais agudas tendam a ficar nas mãos de ligas maiores – como foi nas três primeiras edições, independentemente da baita história do Olympiacos. A Liga Europa é o certame que parece oferecer o meio termo ideal entre atratividade, tradição, variedade e indefinição.

Obviamente, há pontos que merecem um pouco mais de calma na análise. Não sei se foi só uma impressão minha, mas acompanhar a fase de classificação da Liga Europa foi mais difícil nesta temporada. Pode ser o excesso de jogos à disposição. Pode ser a falta de referencial sem mais grupos e confronto direto. Pode até ser a questão dos direitos de transmissão no Brasil, com poucas partidas no cardápio ao vivo da Cazé TV – mesmo que o “Euro 360” feito por eles tenha sido excelente, tanto imagens quanto em informação. Porém, ficaram mais perdidos alguns duelos que, no modelo anterior, pareciam causar mais expectativas.

Por outro lado, há também ganhos visíveis. Por exemplo, achei a rodada final da Liga Europa razoavelmente melhor que a da Champions. Ofereceu mais suspense e mais times em situação de classificação, o que adicionou dramaticidade à disputa – o Braga quase tirou o Fenerbahçe com um gol (que acabou anulado) aos 50 do segundo tempo. Outro ganho é que a distribuição de forças em relação é menos óbvia do que na Champions. Virtuais favoritos, como Porto e Ajax, correram riscos. O Braga, mesmo com tanta bagagem europeia, não avançou. Não deu também para representantes das grandes ligas, como Nice e Hoffenheim, bem como a camisas do peso de Slavia Praga e Besiktas. Que “todo mundo se classifique”, como disse o Bonsa, a LE deu a impressão de que se classificam menos.

Em termos de variedade de ligas classificadas para os mata-matas, a Liga Europa não perde muito para a Conference. Serão 16 países diferentes na fase decisiva, só três a menos que na competição mais jovem. Mesmo que haja um cenário mais amplo para as grandes ligas na LE, não é que elas sobraram tanto assim. E permanece aquele furor de permitir quebras de jejum e ineditismos, especialmente quando não há mais tantos desinteressados da Champions caindo de paraquedas.

O chaveamento dos mata-matas já abre mais portas a uma dose de alternatividade ou de redenção de clubes tradicionais um tanto quanto adormecidos. No caso da Liga Europa, a vaga direta para as oitavas de final soa como mais importante que na Champions, como são elencos mais curtos para lidar com a maratona da temporada. E times que fazem bons papéis em suas ligas nacionais conseguiram corresponder na fase de classificação, tornando factível um prêmio a mais na LE. Não será exatamente surpreendente, por exemplo, se Lazio, Athletic ou Frankfurt se assumirem de fato como favoritos em fases mais agudas.

O que me deixa com uma pulga atrás da orelha é: a gente vai ter mesmo tempo para se acostumar? É inegável a pressão que a Superliga exerce, mesmo tão atrapalhada em todas as suas tratativas, e o atual formato da Champions se sugere talvez só meramente paliativo. Por outro lado, caso a Champions emplaque, pode ser que ofusque a Liga Europa – até pelo excesso de jogos e pela disputa de atenção. Independentemente disso, para quem realmente gosta de futebol, a Liga Europa não deve deixar de ser um xodó. É uma competição que valoriza torcidas e trajetórias, agora fechada em si e sem mais ficar presa aos renegados da Champions. Esses mata-matas prometem.

Leandro Stein
Leandro Stein
É completamente viciado em futebol, e não só no que acontece no limite das quatro linhas. Sua paixão é justamente sobre como um mero jogo tem tanta capacidade de transformar a sociedade. Formado pela USP, também foi editor do Olheiros e redator da revista Invicto, além de colaborar com diversas revistas. Foi redator, editor e sócio da Trivela de 2010 a 2023.

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