terça-feira, março 11, 2025

A noite europeia possível

Achei fascinante uma análise da BBC lembrando que o Celtic havia se tornado o primeiro time britânico a sofrer cinco gols no primeiro tempo de uma partida importante por competições europeias desde o galês Cwmbran Town contra o Progresul Bucareste na Recopa de 1997/98. Parecia uma daquelas estatísticas bem específicas que as transmissões de esportes americanos adoram. Serviu para reforçar o quão ruim foi a derrota para o Borussia Dortmund pela fase da liga, como se os inconvenientes de um 7 a 1 precisassem ser reforçados.

Outra foi um pouquinho mais relevante do que apenas curiosa: Brendan Rodgers havia acabado de sofrer a sua terceira derrota na Champions League sofrendo sete gols. As outras foram contra Barcelona (2016) e Paris Saint-Germain (2017). Extremamente bem sucedido como técnico dos Bhoys, a principal crítica ao trabalho de Rodgers sempre foram seus resultados europeus, especificamente a ingenuidade com que ele encarava partidas contra adversários claramente mais fortes.

Não precisa de nada tão sofisticado para o Celtic dominar o futebol escocês, principalmente enquanto o Rangers entrava em falência e se reconstruía. Mas, com o estilo de imposição, posse de bola, pressão e linhas altas de Rodgers, esse domínio foi quase sem precedentes. Ele conquistou duas Tríplices Coroas nacionais consecutivas, o que nem Jock Stein havia feito, e deixou a terceira encaminhada antes de assumir o Leicester. Desde que retornou, conquistou o Campeonato Escocês e a Copa da Escócia na temporada passada e caminha para mais uma varrida completa na atual.

Não é tão simples assim passar quase todas as semanas orientando o seu time para jogar de certa maneira, com foco no calendário escocês, e de repente dizer “então, essa semana é bloco baixo, todo mundo na entrada da área, chutão para frente e vamos jogar por uma bola”. É um pouco o contrário do dilema que Diego Simeone tem no Atlético de Madrid. Além das preferências pessoais, sua abordagem funciona excepcionalmente bem em jogos grandes e se cobra que ele também encaixe outra para dominar os adversários mais fracos.

Ponderação feita, dizer que não mudaria nada depois de apanhar por 7 a 1 não era exatamente a estratégia de relações públicas que eu adotaria. Mas como ações valem mais que palavras, ficar no 0 a 0 com a Atalanta, às vezes uma das grandes potências ofensivas da Europa, na rodada seguinte, foi uma resposta melhor. O Celtic conseguiu uma ótima vitória por 3 a 1 sobre o RB Leipzig, outra contra o Young Boys e empates com Club Brugge e Dínamo Zagreb para avançar na 21ª posição.

Ninguém lhe dava chance contra o Bayern de Munique e aquela ingenuidade veio à tona quando Harry Kane ficou completamente sozinho na segunda trave em uma cobrança de escanteio no Celtic Park. A indolência bávara contribuiu e precisaria contribuir porque, em condições normais de temperatura e pressão, não apenas o Celtic como a maioria da tabela da Bundesliga só não tem como encará-los.

Mas nesse confronto Rodgers conseguiu encontrar um equilíbrio. Foi relativamente resistente, com Kasper Schmeichel fazendo apenas 12 defesas nas duas partidas. Não é tanto assim considerando que apenas o salário de Kane deve cobrir mais da metade do elenco do Celtic. E nem todas foram difíceis. Contra Superclubes, é meio que o que dá para fazer. Ainda conseguiu encaixar alguns períodos em que ameaçou bastante, principalmente no segundo tempo em Glasgow e no primeiro em Munique.

Criou chances na Allianz Arena pressionando no ataque. O gol surgiu de uma patacoada da defesa alemã, mas, quando Kim Min-jae errou o carrinho na entrada da área, seis jogadores do Celtic já haviam ultrapassado a linha do meio-campo. A mentalidade ofensiva pareceu presente pelo menos no subconsciente dos jogadores em um confronto no qual eles sabiam que invariavelmente se veriam acuados e a absoluta feiura do gol decisivo de Alphonso Davies apenas ratificou que eles fizeram tudo que poderiam fazer.

Talvez não desse para sobreviver à prorrogação, mas foi um jeito doloroso de perder. E também uma das noites europeias que se cobrava de Brendan Rodgers. Como aquela vitória contra o Barcelona na fase de grupos de 2012 ou mesmo um empate eletrizante com o Manchester City, que já estava na conta do norte-irlandês. O triste é que, para um campeão europeu, o primeiro de todo o Reino Unido, é isso que passa por uma grande noite europeia hoje em dia.

Bruno Bonsanti
Bruno Bonsanti
Como todo aluno da Cásper Líbero que se preze, passou por Rádio Gazeta, Gazeta Esportiva e Portal Terra antes de ser redator, editor e sócio na Trivela. Acredita que o futebol tem uma capacidade única de causar alegria e tristeza nas mesmas proporções, o que sempre sentiu na pele com os times para os quais torce.

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